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Cafeara - Com agĂȘncia sem dinheiro, Cooperativa leva Cafeara ao futuro

Cafeara, a 105 km de Londrina, tem 2.900 habitantes

Sicredi deixa medo de assaltos a caixas eletrÎnicos para o passado e facilita transaçÔes com måquinas de pagamento eletrÎnicos para moradores

AgĂȘncia Smart estĂĄ instalada em  contĂȘineres e usa energia solar 

A agĂȘncia bancĂĄria com o cofre cheio de dinheiro fez parte do imaginĂĄrio do cinema policial hollywoodiano por dĂ©cadas, mas nĂŁo cabe na realidade, principalmente para os 2,9 mil habitantes de Cafeara, a 105 km de Londrina, na regiĂŁo Norte do ParanĂĄ. O temor de assaltos a caixas eletrĂŽnicos em cidades do interior, que nĂŁo contam com policiamento, fez com que os bancos desistissem de oferecer acesso a cĂ©dulas e moedas.

A solução surgiu de uma aposta da cooperativa de crĂ©dito Sicredi UniĂŁo PR/SP, que implantou em março do ano passado a AgĂȘncia Smart em Cafeara, um projeto-piloto de serviços e transaçÔes financeiras totalmente digitais. A adesĂŁo dos moradores fez com que a Sicredi iniciasse o processo para levar o sistema a outros municĂ­pios.

Na cidade, o dinheiro fĂ­sico tornou-se coisa rara. NinguĂ©m parece se incomodar com isso, pois todos os estabelecimentos comerciais e de serviços receberam maquininhas de cartĂŁo da Sicredi. Do posto de combustĂ­vel ao consultĂłrio dentĂĄrio, passando pelos botecos mais simples e pela autĂŽnoma que vende pizzas em casa, todos tĂȘm o equipamento.

“Melhorou muito a nossa vida. Mais de 90% da população tĂȘm cartĂŁo. Todo o comĂ©rcio tem maquininha e, para mim, ficou muito mais fĂĄcil receber dos clientes”, explica o dono de uma autoelĂ©trica, JĂșnior CĂ©sar Turosi. Ele acredita que, apĂłs a chegada da cooperativa, o dinheiro virtual dos moradores passou a circular mais pela cidade, beneficiando a economia local.

O caixa eletrĂŽnico mais prĂłximo fica a 20 km, em Santo InĂĄcio. “Antes, todo mundo tinha de ir receber o pagamento lĂĄ. Se tinha de fazer um conserto no carro, jĂĄ fazia por lĂĄ. Se tinha de comprar sapato, tambĂ©m comprava lĂĄ”, diz Turosi.

NĂŁo hĂĄ outra agĂȘncia bancĂĄria na cidade. Cafeara jĂĄ teve unidades do Bradesco e do Banco do Brasil, mas, com os assaltos, os bancos se retiraram. Os Correios jĂĄ atuaram como correspondente, mas foram alvo de violĂȘncia e tambĂ©m desistiram. “Infelizmente, a circulação de dinheiro atrai pessoas fora da lei. EntĂŁo, a população ficou mais segura depois que todo mundo passou a usar sĂł cartĂŁo. Nem mesmo a sede da Sicredi Ă© procurada. Que ladrĂŁo vai arrombar lĂĄ se sabe que nĂŁo tem dinheiro?”, questiona o morador Agenor Ferreira de Oliveira. NĂŁo hĂĄ unidade da PolĂ­cia Militar, que conta com rondas esporĂĄdicas vindas de municĂ­pios vizinhos.
Dono do bar da rodoviĂĄria, Geraldo Magela Pires diz que quase todos pagam com cartĂŁo. Ele mantĂ©m uma quantidade de dinheiro fĂ­sico no caixa e, Ă s vezes, faz o papel de banco. “Quando a pessoa estĂĄ precisando muito, me pede para reservar um dinheiro. Eu sĂł cobro a taxa do cartĂŁo”, conta. Pires concorda que a cidade estĂĄ mais segura. “SĂł eu fui roubado cinco vezes em 2016.”

Luis Arthur Turosi, dono de uma das padarias da cidade, Ă© outro que nĂŁo sente falta do papel moeda. “Mesmo os clientes que compram fiado vĂȘm no fim do mĂȘs para pagar com o cartĂŁo.”

A dona de casa Rosicleire Martins Nunes, que faz pizzas para vender na prĂłpria casa, tambĂ©m aderiu Ă  maquininha. “Todos meus clientes pagam com cartĂŁo. Se precisar mesmo de dinheiro tem de ir buscar fora da cidade.”

O cooperativismo serĂĄ tema do prĂłximo EncontrosFolha, em julho.

INOVAÇÃO E REDUÇÃO DE CUSTOS

O histĂłrico de assaltos e arrombamentos em Cafeara Ă© um dos fatores que afugentam os bancos. A quantidade de provĂĄveis clientes tambĂ©m Ă© um complicador, jĂĄ que a cidade tem apenas 2,9 mil habitantes. “O custo de ter dinheiro torna a agĂȘncia inviĂĄvel. As despesas com logĂ­stica, com seguranças e seguros sĂŁo muito altas”, diz o gerente geral da Sicredi UniĂŁo PR/SP, Éder Romeiro.
Na AgĂȘncia Smart, trabalham apenas duas pessoas, o gerente de negĂłcios, Tiago Borlot Altino, e outra funcionĂĄria. “A gerĂȘncia geral e a gerĂȘncia financeira sĂŁo compartilhadas com outras unidades, o que tambĂ©m reduz custos”, informa Romeiro. AlĂ©m de Cafeara, ele responde pela cooperativa em JaguapitĂŁ e calcula que, com essas medidas, o custo geral caia pela metade.

A criatividade na instalação da cooperativa tambĂ©m ajudou a conter custos, por estar instalada em dois contĂȘineres unidos na forma de um “L”. E o terreno foi cedido em comodato pela parĂłquia da cidade. “A cooperativa valoriza a sustentabilidade. Usamos energia solar por meio de placas fotovoltaicas e captamos ĂĄgua da chuva”, conta o gerente geral.

Tiago Altino diz que, com exceção de movimentar dinheiro fĂ­sico, a agĂȘncia oferece todos os demais serviços de um banco comum. “Atendemos crĂ©dito comercial, crĂ©dito rural, a gama completa de seguros, como seguro agrĂ­cola, de equipamento, de veĂ­culos, seguro residencial... TambĂ©m oferecemos consĂłrcios, abertura de conta corrente, poupança e emissĂŁo de cartĂ”es”, cita. TambĂ©m Ă© possĂ­vel fazer depĂłsito em cheque.

A agĂȘncia em Cafeara conta hoje com 550 clientes cooperados, de uma população economicamente ativa de 1.390 pessoas, segundo o Ipardes (Instituto Paranaense de Desenvolvimento EconĂŽmico e Social). Para atingir esse nĂșmero, foi preciso fazer concessĂ”es. Os cooperados nĂŁo pagam manutenção de conta, nem anuidade do cartĂŁo. Os comerciantes tambĂ©m nĂŁo tem custos no aluguel da maquininha.

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. | Folha Arte


Mesmo assim, de acordo com o gerente geral, a unidade jĂĄ se paga. “A diretoria havia estipulado um prazo de 18 meses para termos retorno. Conseguimos em nove meses. Desde dezembro, estamos operando no azul.”

O diretor-executivo da Sicredi UniĂŁo PR/SP, RogĂ©rio Machado, afirma que a proposta da AgĂȘncia Smart Ă© atender as cidades desassistidas de serviço bancĂĄrio. “Esse Ă© nosso foco principal”, diz. A cooperativa jĂĄ instalou uma segunda unidade do tipo em um distrito de Mococa (SP) e estĂĄ com o modelo em implantação em Guaravera. “Queremos atingir o maior nĂșmero de cidades possĂ­vel.”

Junto Ă  agĂȘncia, a cooperativa leva para a cidade seus programas sociais: “A UniĂŁo Faz a Vida”, “Use e Devolva” (emprĂ©stimo, sem custo, de bicicletas) e a “Escola de InformĂĄtica”.


Mudança de cultura entre clientes e comerciantes

O prefeito de Cafeara, Oscimar JosĂ© Sperandio, afirma que a agĂȘncia da Sicredi foi a melhor opção em relação aos concorrentes, que tambĂ©m nĂŁo ofereciam a possibilidade de saques em espĂ©cie, por facilitar a adesĂŁo a cartĂ”es e a mĂĄquinas de cobrança por parte das lojas. “O principal motivo da abertura dessa agĂȘncia foi a falta de segurança que temos em cidades pequenas”, diz, ao citar casos de explosĂ”es de caixas eletrĂŽnicos no interior do Estado.

Sperandio conta que houve estranhamento em relação ao uso do cartĂŁo, comportamento que foi vencido aos poucos. “Os comerciantes mais antigos nĂŁo queriam aderir, mas hoje as pessoas estĂŁo fazendo pagamentos e recebendo apenas com cartĂŁo.”

A folha de pagamento da prefeitura tambĂ©m migrou para a Sicredi. "Fizemos uma licitação, mas o Bradesco, que era responsĂĄvel por esse serviço antes, nĂŁo quis participar porque nĂŁo se adequaram Ă s exigĂȘncias. Muitos servidores pediram portabilidade de contas no inĂ­cio, porque estavam acostumados, mas agora estĂŁo voltando porque eles [a Sicredi] nĂŁo cobram taxa."

O prefeito também acredita que o interesse aumenta porque a cooperativa promove projetos sociais para capacitação de estudantes e profissionais, além de representar o associativismo, que é bem conhecido e forte entre produtores rurais. "Mesmo os mais idosos, que não sabiam trabalhar com cartão, estão se acostumando, porque não tem cobranças de taxas bancårias e, quando tem, é a metade do que os outros bancos cobram."

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